18 setembro 2017

sandra uribe pérez

[Destino]

El destino de la palabra es el silencio.
Todo vocablo termina por envejecer.
Toda sílaba acaba por fatigarse.
Lo que se dice comienza a perder sentido.
Lo que no se dice es lo que queda.
Lo que no queda, no existe.


[Destino]

O destino da palavra é o silêncio.
Todo o vocábulo estiola.
Toda a sílaba acaba por se fatigar.
O que se diz começa a perder sentido.
O que não se diz é o que fica.
O que não fica, não existe.


06 setembro 2017

jenny xie


Letters to Du Fu

I paid a visit to the province of a past year aided by a pot of wine
self-contempt erects a wide frame almost anyone can pass through

So unruly are my needs who would own up to it
Only a fool would try to imitate the arrow before letting go the bow

*

Du Fu, do not attempt this journeying with a whip of effort
to speed up your travel step backward into the broad forgetting

They say too much brooding elongates the mind
Everywhere one lands the train arrives at the depot early or late

*

Fruitless to try and compare your searching lines
with the rain’s heavy lather I’ll take instead the shaved surface of the moon

We are wiped of age first thing in the morning sleep is a light wash
and don’t we know it we are wrung and wrung


Cartas a Tu Fu

Visitei a província o ano passado ajudada por uma garrafa de vinho
o auto-desprezo erige um quadro quase todos o podem atravessar

As minhas necessidades são tão indisciplinadas quem se confessaria diante delas
Só um tonto tentaria imitar a flecha antes de soltar o arco

*

Tu Fu, não intentes esta viajem com um chicote de esforço
para acelerar o teu trajeto fica atrás no amplo esquecimento

Dizem que a incubação excessiva alarga a mente
Em qualquer lado se aterra o comboio chegará tarde ou cedo à estação

*

É inútil querer comparar as tuas linhas de procura
com a espuma pesada da chuva incorporarei melhor a barbeada superfície da lua

Limpamo-nos da idade logo de manhã dormir é uma lavagem ligeira
e não sabemos estamos a escorrer e escorrer


29 agosto 2017

marguerite yourcenar

Je n’ai su qu’hésiter

Je n’ai su qu’hésiter ; il fallait accourir;
Il fallait appeler ; je n’ai su que me taire.
J’ai suivi trop longtemps mon chemin solitaire;
Je n’avais pas prévu que vous alliez mourir.

Je n’avais pas prévu que je verrais tarir
La source où l’on se lave et l’on se désaltère;
Je n’avais pas compris qu’il existe sur terre
Des fruits amers et doux que la mort doit mûrir.

L’amour n’est plus qu’un nom ; l’être n’est plus qu’un nombre;
Sur la route au soleil j’avais cherché votre ombre;
Je heurte mes regrets aux angles d’un tombeau.

La mort moins hésitante a mieux su vous atteindre.
Si vous pensez à nous votre cœur doit nous plaindre.
Et l’on se croit aveugle à la mort d’un flambeau.


Só soube hesitar

Só soube hesitar; deveria ter estado;
era preciso convocar; apenas soube calar-me;
Durante demasiado tempo fui atrás do meu caminho solitário;
Não me apercebi que iriam morrer

Não antecipei que estaria perante a finitude
da fonte que lava e sacia;
Não compreendi a existência na terra
de frutos agridoces que a morte tem de amadurecer.

O amor é apenas um nome; a existência não passa de um número:
Na rota do sol procurei a vossa sombra;
Colidem os meus regressos com os ângulos de uma campa;

A morte menos hesitante soube atingir-vos
Se pensais em nós o vosso coração apresenta queixa
E consideramo-nos cegos com a morte de uma tocha.


21 agosto 2017

alejandra lerma

Retrato de mi abuela

Mi abuela vive en lo oscuro
pasa horas infinitas mirando al techo
dice que le duele el dolor
arrastra sus temblores junto a la silla de ruedas
a veces se olvida de su nombre

Sus manos se agitan al comer
recuerdo que una vez me alimentó
que me limpió la boca
y me enseñó palabras
todo lo hizo muy firme
estuvo viva para que yo viviera

No soy buena cuidándola
me asusta su tristeza

Temo envejecer con tanta angustia
mirarme en un reflejo
verme como ella
preguntarme dónde están mis hijos
y no poder llorar de la vergüenza

Marina
nunca ha visto el mar
siempre evitó los viajes y el amor
se fue quedando muda
cansada de escucharse
entre la soledad de las pastillas

La miro desde lejos
como a una extraña
se mece entre sus dedos la camándula
el olor de lo que muere la corroe

No comprendo la inclinación de la balanza
quién le ofrendó su peso
cuándo vendrán por ella
dónde guardaron
bajo llave
su alegría.


Retrato da minha avó

A minha avó vive às escuras
passa horas infinitas a olhar para o teto
diz que lhe dói a dor
arrasta as suas tremuras ao pé da cadeira de rodas
às esquece o seu nome

As suas mãos agitam-se a comer
lembro-me que uma vez me deu de comer
limpou-me a boca
e me ensinou palavras
fez tudo com firmeza
esteve viva para que eu vivesse

Não sou boa a tratar dela
assusta-me a sua tristeza

Temo envelhecer com tanta angústia
ver-me num reflexo
ver-me como ela
perguntar onde estão os meus filhos
e não poder chorar de vergonha

Marina
nunca viu o mar
sempre evitou as viagens e o amor
foi ficando muda
cansada de se ouvir
entre a solidão e as pastilhas

Olho-a de longe
como uma estranha
mexe-se entre seus dedos o rosário
o cheiro do que morre corrói-a

Não compreendo a inclinação da balança
quem lhe oferendou o seu peso
quando virão por ela
onde guardaram
à chave
a sua alegria.



20 agosto 2017

carolina dávila

La dificultad nos emparenta
Esas ganas de oponernos
como quien insiste vencido
en prender el fuego después del aguacero

En apilar leña
y raspar con las uñas la corteza
esperando encontrar
en su corazón seco
el origen del incendio

A dificuldade torna-nos parentes
Essas pulsões de nos opormos
como quem insiste vencido
em deitar fogo depois do aguaceiro

Em empilhar lenha
e raspar com as unhas a cortiça
esperando encontrar
em seu coração seco
a origem do incêndio

17 agosto 2017

amparo arróspide

La casa del dolor

Es posible que el dolor sea una casa
de techo altivo y puerta con cerrojo,
donde estás tan a gusto, a veces,
que no escuchas el filo del acero
rasgando los tapices,
suspenso por el aire perfumado:
es heliotropo mezclado con azufre,
busca posarse en los rincones;
la ventana se alza
entre el límite y tú.
Arduo paseo, en el silencio las escuchas,
voces de otros tiempos,
leña para el dolor
siempre hambriento de ti,
exigente como un recién nacido.
Ya lo amas.
La puerta se entreabre y tú la cierras:
No hay nada que temer.

A casa da dor

É possível que a dor seja uma casa
com teto altivo e porta com ferrolho,
onde estás tão confortável, às vezes,
que não ouves a ponta do aço
rasgando os tapetes
suspenso no ar perfumado:
é heliotrópio misturado com enxofre
procura depositar-se nos cantos;
a janela levanta-se
entre o limite e tu.
Árduo passeio, no silêncio as escutas,
vozes de outros tempos,
lenha para a dor
sempre faminta de ti,
exigente como um recém nascido.
Já a amas.
A porta entreabre-se e tu fecha-la:
Não há nada a temer.


16 agosto 2017

fionna sampson

Return

This is world as you
believed in it once
and then again lying
in the grass you lay
flat and squinted sideways
so bright so clear the grass
with the sun in it
you believed you could and could not
enter and now the memory
Proust’s little
cake is delicious
everything gaudy and green
making your mouth
water and your toes curl.

Retorno

Este é o mundo como
antes o vivias
e assim esparramada
na pastura estavas
horizontal e olhando de relance
tão brilhante e clareira a relvura
encimada pelo sol
acreditaste poder e não poder
entrar e agora a memória
a nata de Proust
deliciosa,
tudo verdúneo e inebriante
fazendo a tua boca
salivar, encaracolando o teu dedão

natalia azarova

[я кошачая птица...]

я кошачая птица
вся в солнечных оплеухах
подскользнулась в пост весёлых
мыслей

а вы с какой целью хорошо поживаете?
а вы с какой целью здоровы и веселы?
стаканы тока в такт клетчатых
одеял

куличики чаек песочных

sou uma ave felina
coberta por cascas apolíneas
escorri-me em jejum de alegres
pensamentos

e vocês? Porque dizem que estão bem?
e vocês? Porque dizem que estão saudáveis e alegres?
copos de torneira ao compasso de mantas
quadriculadas
castelos de gaivotas de areia